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Casamentos, S.A.

Vivemos numa sociedade em que tudo se compra, tudo se vende, tudo se negoceia. A sociedade capitalista preconiza o valor absoluto do mercado e do negócio. O negócio chegou mesmo às relações interpessoais: hoje compram-se os amigos, compram-se os colegas de trabalho, compram-se os filhos, os pais e compram-se também o marido ou a mulher. O problema já de si grave e alarmante, torna-se ainda mais inquietante a partir do momento em que deu lugar à compra dos sentimentos: amizade, amor, camaradagem… vendem-se e compram-se em qualquer parte e por toda a parte.

Para dar escoamento a tantos negócios vão surgindo as agências que servem de trampolim e mediação para os negócios (até os negócios são negociados). Desde há alguns anos o nosso país tem assistido ao surgir e desenvolver das chamadas agências matrimoniais, por exemplo. Servem para entabular conhecimentos e tendem a “fazer” casamentos entre indivíduos, que minimamente se conhecem ou que simplesmente dizem não ter tempo para o encanto do enamoramento. Pode parecer mentira, mas a verdade é que muitas das pessoas que procuram uma relação matrimonial por intermédio destas agências fazem-no porque dizem não ter tempo, já que o pouco tempo que têm é dedicado ao êxito profissional e à busca de prestígio profissional. E quem assim se entrega à profissão, por medo de ficar desempregado, ou por desejar subir de posto, acaba por ter que sacrificar muitos aspectos da sua vida, um dos quais chega a ser o coração e os sentimentos que dele afloram.

Estamos assim reduzidos a uma existência numérica em que somos conhecidos apenas pelo nosso número do bilhete de identidade ou de contribuinte. Perdeu-se o calor, a proximidade e a expressividade de um olhar. Vivemos sem nos tocarmos, sem nos olharmos e sem nos cheirarmos. O cheiro que na maioria das espécies animais continua a ser o primeiro passo, senão o único, para o entabular de relações. As agências, de qualquer tipo que sejam, existem para facilitar a vida e para serem serviços de ajuda ao indivíduo. Mas, como tudo na vida, têm o seu lado macabro e no caso esse lado macabro prende-se com o facto de serem sociedades frias, anónimas e de responsabilidade limitada.

Nesta edição fomos conhecer esse estranho mundo das agências que servem de intermediárias nas relações humanas. Escolhemos uma agência matrimonial, por ser exactamente a expressão mais perfeita do que acabamos de dizer. Conhecemos o seu trabalho, ouvimos os seus dirigentes e ficamos mais convictos das ideias que já tínhamos antes. Transpusemos para as nossas páginas o que vimos, como forma de alertar os mais incautos. Afinal nada e ninguém poderá alguma vez substituir um toque de mão, ou um aroma sentido.

[Edição Nº 4673, 20 de Setembro de 2007]

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