Carta aberta ao senhor primeiro-ministro
Obrigado, senhor primeiro-ministro, por promover a leitura, com o fim do porte-pago à imprensa regional; por favorecer o acesso aos jornais a toda a população portuguesa e por promover a cultura, o bem-estar e a educação, neste nosso Portugal à beira-mar plantado.
Obrigado, senhor Sócrates – permita-me que o trate pelo nome (faz-me lembrar um outro senhor, que ficou na história por ser, embora de forma diferente do senhor, tão amante da cultura).
Mas, porque ninguém é perfeito, permita-me, também, que lhe aponte algumas críticas e desafios. A meu ver, que será sempre tão insignificante diante da sua sabedoria e capacidade de antecipar o futuro, as medidas que agora toma em relação ao fim do porte-pago (sim, é o fim, não adianta desmentir) são das piores decisões do seu Governo, já de si tão polémico, e (escreva o que lhe digo) vai ser o motivo para acabar com os seus dias de reinado (não é uma ameaça, mas em tempo de previsões, deixe-me tomar a ousadia). Terminei um curso de comunicação social há menos de dois anos; aí se disse que é falsa a ideia de que a comunicação social seja o quarto poder. A verdade é que ela já ultrapassou o terceiro poder. Vossa excelência saberá, certamente, qual é o terceiro poder instituído nas democracias?! (É o seu). Pois ensina-se hoje nas escolas de Paris que o terceiro poder passou para quarto, enquanto que o quarto vai subindo na escala de classificação. Isto significa (e disso não tenho dúvidas) que, se nós quisermos, o senhor acabou de decretar o fim do seu reinado.
Por mim pode dormir descansado, porque não vou avançar com qualquer ideia inovadora; tenho-as na cabeça, mas não lhes dou pés para andarem. Pelo menos, por enquanto… até estou a precisar de férias, e, para já, é assim que entendo o tempo de paragem a que vossa excelência me obriga, com o corte ao porte-pago. Mas não respondo pelo que vou sentir, depois de me cansar de estar em férias. Pode ser que “a porca torça o rabo” e aí não sei o que poderá acontecer.
“O Estado não deve ser um obstáculo”, disse, há dias, o senhor Presidente da República Portuguesa. Mas será que o senhor Sócrates (desculpe o atrevimento), com esta decisão de cortar o porte-pago aos jornais regionais, não está a ser um obstáculo?... Se não, mostre-nos como. Se sim, tenha a coragem de rever o que já decidiu.
Há outras formas de ir buscar dinheiro aos jornais, se é esse o objectivo... posso explicar-lhe como. Mas cortar o porte-pago não é, seguramente, a melhor... Esta é a forma para acabar com os jornais, não a forma de lucrar com os jornais. Mas o senhor é quem sabe…
Desejo-lhe um bom ano 2007 e que tenha muito, muito dinheiro, mesmo que seja à custa da ignorância e da cegueira dos portugueses.
[Edição Nº 4637, 4 de Janeiro de 2007]
Etiquetas: editorial